segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Rock de brinquedo

Atenção: postagem copiada do blog Caixa Preta, do portal Rock Press, link original: http://caixapretaportalrockpress.blogspot.com/2010/01/rock-de-brinquedo.html

Texto de Eduardo Abreu.


Se você leu o artigo “Disco é cultura”, publicado aqui no blog, sabe que uma das opiniões do Caixa Preta é que a música digital engoliu uma cultura –a da apreciação do disco– que ajudou a moldar a história do rock como a conhecemos.

Nos meses seguintes à publicação do texto, o radar deste blogueiro detectou a avalanche de rock juvenil que vem dominando todos os veículos conhecidos. E a culpa, mais uma vez, recai sobre os MP3 que você anda baixando no seu computador. Continue a leitura e entenda porque.

Um dos maiores argumentos a favor do livre tráfego de arquivos de áudio pela internet são as possibilidades de autopromoção para o artista. Ou seja, agora ele não precisaria mais da nefasta figura da gravadora para fazer sucesso.

Mas note que os mais ferrenhos defensores desta corrente, não por acaso, são pessoas que não gostam de música. Iguaizinhos aos antigos tubarões das gravadoras, desde sempre estigmatizados por devorarem carreiras e largarem suas carcaças por aí.

Se você não sacou, estou falando dos marketeiros digitais.

Há alguns meses, recebi um exemplar da revista Meio Digital – publicada pelo grupo Meio&Mensagem, maior editora e promotora de eventos do mercado publicitário nacional. A capa da revista exaltava as tais “possibilidades” de promover um artista na internet.

O case da vez era Mallu Magalhães, que posava na capa ao lado de um time que incluía executivo de operadora de celular, CEO da falecida filial brasileira do MySpace e até um sujeito com nova profissão: "empresário com pegada digital". O título da matéria não podia ser melhor, ou pior: "A banda agora é outra”. Lindo, não?


Repare, não se fala de música, mas, sim, de estratégias para gente que não gosta de música ganhar dinheiro com música. Normalmente, a jogada é oferecer música como brinde para a molecada. Coisas esquisitas como “conteúdo embarcado”, um jargão mercadológico para as porcarias do artista pop do momento que turbinam os celulares. Existe até um prêmio para artista popular em aparelho celular, um equivalente telefônico do hoje pálido disco de ouro…

Você pode não perceber, mas é a visão cada vez mais marketeira da música, com target e demographics muito claros, que vem despejando no seu ouvido aberrações juvenis como Cine e Hannah Montana.

As boy bands e artistas pop adolescentes de laboratório sempre existiram, mas a infantilização do rock, na escala atual, com certeza é novidade – e consequência direta da música digital.

Veja como a lógica é simples: música, hoje, só se consome pela internet e o maior contigente de consumidores digitais parece ser mesmo o infanto-juvenil.

A coisa está tão segmentada, e sedimentada, que pra reunir os Beatles vivos e suas viúvas, só mesmo lançando um game do grupo – o tal “Rock Band”.

Na TV que o Brasil assiste é a mesma coisa. A Globo, repetidora de tendências que é, já deu um jeito de botar o rock-mirim na sua grade através do seriado “Geral.com” – uma tentativa de vender o rock internético embalado para uma faixa-etária ainda menor que aquela do “Malhação”.

E não pense que pára por aí, pois o fenômeno espalha suas garras pra todos os lados. De uns anos pra cá, surgiu a modalidade “Garage Band” em edifícios residenciais. Trata-se de um local de ensaio para bandas, recurso para deixar os pais tranquilos que sua prole não vai sair do condomínio pra tocar aquele rock perigoso de antigamente.

Há algum tempo, veja você, estive em um churrasquinho inofensivo. Familiar até. Entre um gole de cerveja e outro, ouço um riff de guitarra. Dali a pouco o mesmo riff e parecia até conhecido. Mais alguns minutos, ouço a guitarra de novo. E de novo. Era o riff de “Raining Blood”, do Slayer.

Confuso, perguntei ao dono da casa de onde vinha a repetição da diabólica base de guitarra criada por Kerry King e Jeff Hanemann e que em nada combinava com a atmosfera bucólica do lugar.

“São as crianças. Estão jogando Guitar Hero. Elas adoram essa música”.


Deu medo? Em mim também.

2 comentários:

Rodrigo Prado disse...

Concordo com tudo que ele fala. Toda a prole que segue esse rock "colorido" anda ganhando mais força impulsionada pela mídia burra que busca rostinhos bonitinhos e músicas para agradar pais e mães. Não passam de uns garotos, uns eternos garotos. Nunca vão crescer. Sempre continuarão em suas visões coloridas de todos os fatos, com seus Wayfarers rosa-choque.

Rodrigo Prado disse...

Fiz uma citação à vocês no meu blog. Se pudessem dar uma conferida, eu agradeceria pra caramba.

www.cinesom.wordpress.com

Abraços.